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sábado, 11 de maio de 2013

Amigos, amigas, posto hoje um texto por reflexão de uma peça que vi, Kafka e a boneca viajante.
Um autor, creio que sempre escreve seu canto de cisne e um dia acerta, quer registrar antes que a morte dê seu derradeiro veredicto, mas a vida tem surpresas, como na de Kafka, que eu suponho um ser triste, como a gente muitas vezes, mas aí vem essa menina procurando uma bonequinha perdida e...
Blogueiro pensativo
Publicado em 09/05/13 Tribuna Piracicabana, a foto desta postagem é da cena Lugar onde o peixe para, das meninas, Edeleise (Vânia) e Dora (Luzia Stocco)
         O lado lúdico de K.
(Kafka e a boneca viajante)
Pela rua D.Pedro II e cruzamentos, atrás dos saltimbancos caipiras do grupo Andaime de Teatro, chegamos ao parque D. Bosco onde descobri um novo Kafka, levantado na passagem do último ano de vida deste por Jordi di Sierra I Fabra, na obra intitulada Kafka e a boneca viajante.
Sempre vi um Francz Kafka sisudo, tétrico, sem a dimensão lúdica; quem leu A metamorfose e O processo associa o escritor ao personagem senhor K. Este um cidadão sem nome, somente com uma sigla, sem nenhuma ilusão ou
sonho, perseguido e oprimido, na A Metamorfose é um verme, em primeira pessoa. Conheci Kafka por estes escritos e que nos leva a um mundo sem
saída, fatal; mas Jordi mostra outro Kafka.
Escreve Jordi que a menina Elsi encontra o escritor já doente e no último ano de sua vida, no parque de Berlim, Alemanha, passeando. Entre soluços, a menina pergunta ao escritor se vira a sua bonequinha, Brígida. Não, claro que não, até este momento, por certo Kafka tinha outras preocupações e sua doença terminal, mas comove-se com a perda de Elsi e, num segundo momento, à guisa de sua criatividade, muda a história da vida real, recompõe-se dizendo mais ou menos assim: ver não vira, mas Brígida fora viajar por conta própria, não a perdeu, era a boneca que estava se emancipando, viajando por Paris e mundo afora. Contudo, mandaria cartas para Elsi. Missivas que na verdade o próprio Kafka escrevia às escondidas, feito a boneca Brígida, dando-lhe personalidade e voz à fantasia de Elsi.
Atento-me pelas fantasias boas de Kafka e de que pôde dar sua caligrafia e assinar com esse fantástico pseudônimo feminino. Tinha no rosto da menina a recompensa por este empreendimento literário à leitora e destinatária mais fiel - faz consulta ao mundo da infância para isso, indo com uma criança vizinha colher informações sobre essa relação lúdica com este brinquedo e começa a escrever cartas a Elsi, como se boneca e carteiro fosse.
O que seria para Kafka, no último ano de vida dos quarenta e um vividos, uma boneca de nome próprio? O verme de A Metamorfose ou o acusado de O processo ficaram
para trás?
Vejo aqui um novo caminho, uma saída criativa que as crianças têm e que se mostra em Kafka. O resgate de perdas afetivas da infância que ele projeta na boneca e na menina, tornando falante a boneca e carteiro o escritor.
Quando um escritor conhece o seu leitor interno, coloca-se totalmente nas mãos deste, um alter ego de si mesmo e as palavras essenciais surgem.
Não, Franz Kafka não morreu como um senhor K, ou como um verme de A
Metamorfose, mas por certeza metamorfoseou-se no transmundo do
inconsciente, nas almas de artistas e saltimbancos, como amigos de
praça, onde o comum habita, onde até o eterno tem vez.
Parabéns ao grupo Andaime de Teatro, ao diretor Rogério Tarifa e aos companheiros de rua, de estrada e de praças, nas margens desta folha da vida, na rua da eternidade, nesta viagem com Brígida e Kafka em Kafka e a boneca viajante.
Comercial:
Temos nossas obras em livro também, contate-nos pelo e-mail quartarollo.camilo@gmail.com

2 comentários:

  1. No sofrimento alheio, libertamo-nos dos nossos... quando há convicção de cumplicidade, de partilha, de ser comunidade em toda e qualquer situação... Procuremos, ainda que em sonho, nossa bonequinha emancipada...
    Abraço, Célia.

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