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O blog atém-se às questões humanas. Dispensa extremismos ou patrulhas. Que brilhe a sua luz. Bem-vindo e bem-vinda!

sábado, 10 de setembro de 2011

Duas palavras

Neste feriado de sete de setembro estivemos aqui em Piracicaba o show do Mazinho Quevedo e Tinoco, com seus noventa anos. Seu carisma é admirável, sua força e disposição para lutar pela cultura raiz, do homem simples, a genuína. Na última vez que o vira, há alguns anos quando autografou um cd para mim eu estava falante e disse-lhe do meu pai que gostava dele e ele perguntou "onde ele mora?", coisa de caipira que conhece o lugar e conhece a pessoa e para homenagear vide o texto abaixo, Duas palavras.
(Ao lado, quadro do artista piracicabano Almeida Junior, Caipira picando fumo; que serviu de capa de cd de Rolando Boldrin e outros.

Duas palavras
- chove?
Pensei que ele não tinha ouvido, mas ouviu sim. Um ventinho refrescante soprava na noite cálida e da porta baixa nós proseávamo
s sentados em toco. Vez ou outra Kaiú espiava dentro da casa, longamente, seus olhos corriam as paredes de pau-a-pique, uma sacola dependurada, uma janela tramelada, mais ao fundo o fogão com o tição guarda-fogo, o estalos da lenha teimava e a natureza falava por si.
Depois voltou os olhos mais calmos, não carecia de dizer nada; mas um homem da cidade não suporta tanto silêncio, dei algumas tossidas de alerta, que o Kaiú estranhou. Achando que era algum pedido, o caipira pegou-me mais uma caneca de café, mas agradeci com a mão, também me calei de boca. Insistiu mostrando que pegara para mim e a tomei aos goles, soprando baixo o café fumegante.
No galinheiro ali pertinho era um silêncio divino, a noite punha-se no ninho das carijós. O homem estava satisfeito com o luar de feitiço e com o clarão do terreiro de chão batido e limpo, varrido. Pelas bandas dos eucaliptos viam-se algumas aves selvagens amontoadas nos galhos. Bem, achei ter visto alguns quatis ou outro bicho correndo à sorrelfa. Kaiú dava uns sorrisos de encantamento, sem esforço e sem o saber, ao observar os animais fazia menção da presença dos mesmos com gestos de cachimbo, como a incensar a mata.
Parecia que o caipira segurava as nuvens passageiras atrás dos eucaliptos com os olhos, enquanto fazia de fora sua sala de visitas. Eu achava que ia chover, mas depois do passeio da lua entre nuvens escuras que se abriam às estrelas mudei de ideia, chover não ia. Precisava ir-me do toco e ele disse por fim:
- Pruquê?
Eu também sou parte desse rincão, no mundo do caipira há lugar para todos. Já estou com saudade de voltar lá para conversar com o
Kaiú.

3 comentários:

  1. Parabéns primo, belo conto caipira.
    De uma passadela no meu blog, postagem nova.

    Abraços
    Walter

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  2. E a capirada é boa pra "contá" um conto e "aumentá" um ponto, não é mesmo Camilo? Abraços Poéticos desta CaipiracicabANA Marly de oLiveira Jacobino

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  3. Taí, Camilo, gostei do conto. Você conseguiu criar um clima caipira muito agradável. Parabéns!

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