Amigos(as), procurei uma foto boa para pôr no blog, mas a que eu encontrei boa não pude copiar, é a de um menino de cócoras comendo um pão no lixo, muito forte - nesta série de fotos existe uma de um menino negro junto com urubus, na África. Bem, isso me mostrou que existe muita miséria e geradores dela, todos sabemos. Que Deus tenha piedade de nós, mas das minhas reminiscências ainda me dou ao luxo de escrever e tentar abrandar corações como o meu mesmo.
O blogueiro sem imagem
Pão e s m i g a l h ado o - publicado na Tribuna Piracicabana de 04/04/13
Havia um
guarda-comida azul, um móvel de madeira que não mais existe. Hoje é um caixote
de metal regelado de coisas frias com um pinguim solitário encima. Dizem que
abrir muitas vezes a porta da geladeira é sinal de carência de mãe, transferido
a este móvel frio da modernidade, pertencente à linhagem branca, mas de
qualquer cor e reço.
Dos guarda-comidas
que me vêm à mente, de flash de final de semana – talvez para escrever isso e
vencer a carência ou a náusea, lembro-me do da minha avó - carência de mãe e de
avó - com portas com redinhas e louças de estimação.
Ora, antes nem os
pacotes de biscoitos tinham rótulo, distinguíamo-los pela forma, textura e pelo
barulhinho nos dentes; agora, entretanto, querem embalar tudo num rótulo bonito
ou piedoso: carência... Dentro daquele
móvel tudo se conservava a quente, os ovos, os queijos, e a solidariedade aos
vizinhos, uma xícara de óleo, um pouco de sal, e um pretexto em se avizinhar.
No meu evangelho de
orelhas li das muitas moradas na casa do Pai, segundo São João. O ser humano
tem muitas moradas dentro de si também.
Hoje senti o cheiro
de faíscas de pão de antigamente, a única coisa que as formigas carregavam do
guarda-comida, migalhas do chão. Para mim era alto o móvel já antigo naquele
tempo, mas o centro da cozinha de nossa casa.
Assustei-me quando
mudamos, vi a parede vazia, algo do meu eterno foi tocado. Pensava em desafiar
as formigas a que devolvessem o guarda-comida ao centro da cozinha para o
benefício delas. Lá não era mais nosso, mudamos, mas fora nossa casa como que para
sempre, num contrato tácito, lavrado no livro dos sonhos.
Saudades, dizem e
acrescentam ser um vocábulo nosso, muito nosso e pensam num português choroso,
mas não estou me condoendo em nostalgia, só estou conversando com minha
saudade.
Meu pai inda vive, respira com muita dificuldade
e me sente em sua presença, fui lá hoje.
Pude mais uma vez dizer-lhe “meu
amigo”, talvez porque foi meu despenseiro ou por que não me reconheço sem ele.
Diante do céu azul com nuvens brancas esparsas me vem um nome: Pai. Meus olhos
ainda são aos de criança para muitas coisas, não me peçam sabedoria adulta ou
de filósofos ateus, nem tirem meu chão de migalhas por enquanto. Sou a última
das formigas.
--------Crises do filho do meio, meu quarto livro lançado este ano com 184 páginas por R$20,00 o exemplar. Se você se interessa, reserva um cantinho e um tempo das migalhas que sobra de tempo, você pode até se fascinar pelo meu texto. Em querendo contacte-me pelo camilo.i@ig.com.br
Escritor em causa própria, leitor em sua causa.
Perto da sagacidade de nossos pais... sentimo-nos formiguinhas com trejeitos de cigarras... ao encontro do outono / inverno deles. E, nossos também!
ResponderExcluirAbraço.
Célia.
Grato pelo comentário, Célia. Sempre prestigiando os novatos e "crianças" como eu.
ExcluirCamilo