Amigos, para os dias dos pais publico reflexões que tomei da vivência com o meu. Abç.
Blogueiro filho
Uma vida por minha vida (meu velho)
Blogueiro filho
Uma vida por minha vida (meu velho)
Um
prato de sopa fumegante. A noite vai cobrindo o mundo. Á diante o prato de um
líquido engrossado de aromas, o pão lhe ajuda a juntar o que sobeja, o prato
será limpo e o apetite satisfeito como na infância. Olhos miúdos e negros em
trabalho de escuta, bem vivos, que observa o falatório – mas, que o mundo se
move, se move. Suas mãos tremem e o talher bate no prato, cansado de chamar, de
tilintar. A comida vem à boca que suga o caldo com dificuldade. O corpo está
cansado, trêmulo e afinado com a vida diária. Não reclama de nada. Não se
queixa de seus males constantes. Treme, por vezes, freneticamente. As migalhas
da vida lhe caem na roupa, a rebate sem se importar. As roupas nem sempre
combinam e está perfeito ao seu figurino austero. Não escolheu a grandeza, mas
o simples e o comum.
A idade
avançada lhe parece à vista e não a esconde. Os talheres lhe são como os
cinzéis do Aleijadinho, por vezes, tem de se manobrar todo para que um bocado
de comida venha à boca e não quer ajuda. Derruba parcialmente, pegando a colher pelo viés errado, a mão não manobra
bem. O guardanapo lhe socorre por uma mão auxiliar e pródiga - a esquerda.
Os
remédios é uma boa soma de pílulas, de drágeas e de goles amargos, a desgosto
das papilas. Os toma religiosamente. Todo o dia. A mesma coisa? Não. Por vezes,
derruba embaixo da mesa. Desta feita, faz o bichano ir para o armário e deixar
a cozinha para o seu desjejum e o gato não lhe roubou o remédio, preferiu o
sono a azedar seu paladar. As drágeas caídas correm como tampas de lata de
leite em pó, escorregam por baixo de algum móvel esquivo, bamboleiam e caem
deitadas num movimento circular a pranchar no chão, que a ele parece ouvir-lhe
o ruído. Mas, pelo preço de cada uma, se arrisca entre as cadeiras a reviver os
brinquedos da infância e pega o dito remédio, vitorioso. A danadinha vai pro
papo. Joga novamente para cima e a abocanha no ar, desta vez. Dá-se a chance de
errar e brinca com a vida, a despeito da lógica de Murphy.
O andar é
vagaroso, não tem pressa mesmo. A vida lhe deu a paciência, a serenidade anciã.
Os meus medos infantis se foram em suas rugas. Escolhe seus sonhos e seus
desejos mais harmoniosos, mais miraculosos, que permanecem em segredo. Ninguém
quer ouvir. Já velho pode dar-se ao luxo de falar bobagem e não ser ouvido, a
função “gagá” lhe dá imunidade aos seus atos e aos seus sonhos. Pode fazer tudo
que fora proibido pela sociedade, pela educação dos mais “corretos”, até o
padre o passa adiante no confessionário, agora somente Deus o aprecia
devidamente e divinamente. As culpas já prescreveram da costa deste adão.
Aposentou os sapatos pelos pés nus, o correr pelo caminhar e o tempo pela vida.
Homenagem ao meu pai Alessio Quartarollo,
paciente de mal de Parkinson.
Um abraço para o seu papai Alessio, feliz domingo!
ResponderExcluirAbraços!
Olá, Camilo! Encontrei-me em sua história o que vivi com meu marido... Comoveu-me. Mas, é o deslizar da vida entre nossos dedos. E, o coração vibra a cada encanto e desencanto... Linda a sua crônica rela da vida de muitos de nós! Beijo as mãos de seu pai. Amém! Felicidades! Abração da Célia.
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