Amigos, aproveitei esta crônica para falar de um tema polêmico e que muitos falam sem conhecimento. A finalidade da crônica não é dar conhecimento de nada, mas que não nos tornemos mais desumanos que já somos.
Blogueiro impaciente
O médico cubano
Naquelas redondezas
nunca houvera médicos. Os nascimentos eram com as parteiras, as doenças
curavam-se com chás e o óbito, sim, o limite próprio da existência na última
morada. Disseram da “importação”
de médicos cubanos para regiões distantes, aonde médico brasileiro não quer
sujar seu jaleco branco. Importação, como se fossem produtos. De férias
naquelas paragens vi um. De óculos grossos e feições a lembrar o senhor Barriga
do seriado Chaves. Pronto, o socorro de minhas viroses, gripes encubadas e...
aatchin (espirros constantes), pior que tosse, evoluíra para o espalha-vírus, estes
terríveis incidentes sociais, dos quais a pessoa amada logo manda você colocar
a mão na boca, e diz que horror para as paredes. Talvez eu tivesse cura para
esse vexame, aliás, atire a primeira pedra quem consegue segurar um espirro,
nem o Barbosa consegue – acho que foi assim que aprendi a falar, aaaaatchinnn,
espirrando sílabas. Lá no P.S. Aguardei
numa pequena fila e depois fiquei sabendo que nela estavam todos doentes da
cidade, cujo nome não me lembro e cuja entrada era pela rua de saída. O médico
falava um portubano e de rosto afável de gorducho. Quase me veio uma chacota
para fazer dele e ele percebeu, riu antes. Pude observar da
maca, como paciente da vez, que um cão nos olhava. Ora, ele deixava seu animal
ali sem coleira pela ala médica, a transmitir alergias o peludo. Sim, um cão
todo desgrenhado, malhadinho e feio, que brinca nos açudes e pelas caatingas
poeirentas, a me vigiar com seus pelos eriçados. Fazia o médico seu
diagnóstico num silêncio abissal que eu podia ouvir as batidas do meu coração,
tuc-tuc, tutuctuc; tudo bem, confundi algumas destas batidinhas com as do rabo
do cachorro na cadeira. E ainda deu outros tuc-tuc no meu costado, nos pulmões. Sentamos à mesa de
receitar. Ele franzia a testa, mas sereno. O cachorro deitou ao meu lado com a
língua de fora. Agora só faltava a foto do Fidel Castro na parede, a ditador, e
a assinatura do senhor Barriga na receita... uns dois sapos em jejum por dia, um
já engolira. Comunista safado, haveria de se pensar, vendo-o rabiscar
delgadamente o papel brasileiro, com o mesmo jaleco que vi na tevê. E por fim
disse:
- O señor non vai
tomá nada.
Nada?! Aproveitei a
deixa e ia enfiar meu bom português nos seus ouvidos, mas gaguejei.
- Esse cachorro é
seu?
- Non, esse é o
Chiquinho, num lembra?
Ah, o cachorro sem
dono que visitou o papa argentino. Papa argentino, médico cubano, computador
paraguaio, lanche americano, espionagem americana de e-mail e da rede social (talvez
eles estejam lendo isso)...
- E a receita?
- Quê receita? O
señor vai se consultar com Fono.
- Fono! E a virose?
- Virose! O senhor
tem problema de comunicação, fala cuspindo.
Saí de lá e depois
da Fono a virose sarou ou se acomodou no fundo da caixa de remédios
alopáticos. Eu não tinha nada, somente uma doença crônica, a de escrever.
*O cronista é autor de Crises do filho do meio, se não tiver a obra, pode-se adquirir pelo quartarollo.camilo@gmail.com