Grato aos leitores dos 76 acessos e aos seguidores do blog, que amavelmente vêm a este veículo ler ou/e comentar. Estamos abertos em ouvir críticas, inclusive sobre a gramática ou figuras de linguagem, etc.; façam aqui ou no meu e-mail quartarollo.camilo@gmail.com e grato também À Tribuna pela publicação em suas páginas. O texto se refere a experiência que eu e meu irmão Fernando tivemos em olhar meu pai acamado, depois de seu tratamento para próstata, e suas dificuldades já acometido pelo parkinson. Grato a todos por compartilhar de nossa vida. Aproveito para dizer em favor da Tribuna Piracicabana, que é um jornal de interior, genuinamente piracicabano e seus artigos não se prendem só à dissertação ou ao mercado de patrocínio, mas cuida de ser um jornal de alma, não mera reprodução de informações frias e superficiais de amenidades, vermelhas ou de holofotes, tem dado espaço à literatura e aos autores da cidade. Difícil, mas tem essa força. E se mudar o i e a de campainha e teremos por assimilação a nossa companhia.
Ao se olhar com a consciência, muda-se a realidade.
Campainha
Não anda por si, não consegue deglutir, nem sorver líquidos. Seu corpo está limitado às mãos de outrem e o moço de branco não viria me render esta noite. Na folga dele a família revezava-se em desculpas. À sós com o doente fiquei. A noite alongava-se em penumbras do sono leve e alguns ais dele. Levanta-me, dá-me água, cobre-me, puxa aquela perna para cá. Mudava sempre de posição na cama sem se ajeitar em conforto. Sua silhueta era arquejante, em declínio das forças, a vida efêmera lhe ia deixando sob meus olhos, que relutavam em ver. Nos meus “dordolhos” e medos de infância ficava comigo, confortava-me. Ele fazia-me vencer os medos da noite, da depressão noturna, dos fantasmas.
Havia um relógio redondo onde eu contava as horas, conhecia bem aqueles ponteiros antigos e o barulho das engrenagens punham ordem no acaso. Meu tempo interior pulsava e meus ouvidos de dentro cochilavam até o repicar da campainha. Ele acordou, a fralda vazou. Vai tomar banho numa cadeira de rodas, lavo-lhe e o ponho na cama e não dorme, mata o tempo.
Saio a ver nas cercanias da casa velha, os puxadinhos de italianos. O quintal com flores e frutíferos que nasceram de alguma semente que quicou da lata de lixo. Meu avô chupava laranjas por ali. Durante o dia havia pássaros, agora via algumas nuvens e silêncio onde sentávamos para conversar. As árvores resistiram nessa terra penhorada. Naquela cadeira velha meu avô recostava-se com seu terço e chapéu e ali sentava eu para ver o pôr-do-sol e olhava de pescoço longo como a empurrar os prédios feito cortinas. A serra de São Pedro ficava logo ali, perto de nossos sonhos. Ali eu abria algum livro de leitor vagabundo e falava comigo mesmo. Os poucos que tive foram os melhores, porque os li. Lembro-me que parava a leitura para carregar o caminhão de feira e sentia o cheiro do depósito – uma suposta fortuna, hoje memórias de alguns estrados e bancadas velhas. Por vezes parava e meu pai estava fazendo contas, gostava de ganhar dinheiro e “amanhã a feira vai ser boa”, dizia. Deixava-me ler e nos encontrávamos na troca rápidas de algumas palavras. Se necessário, até fazia algumas citações, mas nunca foi um teórico, era um homem de atitudes próprias, com uma rude discrição. Alguns daqueles livros ainda estão empilhados por lá e eu por aqui de enfermeiro, tento curar minhas dores até o próximo repique da campainha.
Não anda por si, não consegue deglutir, nem sorver líquidos. Seu corpo está limitado às mãos de outrem e o moço de branco não viria me render esta noite. Na folga dele a família revezava-se em desculpas. À sós com o doente fiquei. A noite alongava-se em penumbras do sono leve e alguns ais dele. Levanta-me, dá-me água, cobre-me, puxa aquela perna para cá. Mudava sempre de posição na cama sem se ajeitar em conforto. Sua silhueta era arquejante, em declínio das forças, a vida efêmera lhe ia deixando sob meus olhos, que relutavam em ver. Nos meus “dordolhos” e medos de infância ficava comigo, confortava-me. Ele fazia-me vencer os medos da noite, da depressão noturna, dos fantasmas.
Havia um relógio redondo onde eu contava as horas, conhecia bem aqueles ponteiros antigos e o barulho das engrenagens punham ordem no acaso. Meu tempo interior pulsava e meus ouvidos de dentro cochilavam até o repicar da campainha. Ele acordou, a fralda vazou. Vai tomar banho numa cadeira de rodas, lavo-lhe e o ponho na cama e não dorme, mata o tempo.
Saio a ver nas cercanias da casa velha, os puxadinhos de italianos. O quintal com flores e frutíferos que nasceram de alguma semente que quicou da lata de lixo. Meu avô chupava laranjas por ali. Durante o dia havia pássaros, agora via algumas nuvens e silêncio onde sentávamos para conversar. As árvores resistiram nessa terra penhorada. Naquela cadeira velha meu avô recostava-se com seu terço e chapéu e ali sentava eu para ver o pôr-do-sol e olhava de pescoço longo como a empurrar os prédios feito cortinas. A serra de São Pedro ficava logo ali, perto de nossos sonhos. Ali eu abria algum livro de leitor vagabundo e falava comigo mesmo. Os poucos que tive foram os melhores, porque os li. Lembro-me que parava a leitura para carregar o caminhão de feira e sentia o cheiro do depósito – uma suposta fortuna, hoje memórias de alguns estrados e bancadas velhas. Por vezes parava e meu pai estava fazendo contas, gostava de ganhar dinheiro e “amanhã a feira vai ser boa”, dizia. Deixava-me ler e nos encontrávamos na troca rápidas de algumas palavras. Se necessário, até fazia algumas citações, mas nunca foi um teórico, era um homem de atitudes próprias, com uma rude discrição. Alguns daqueles livros ainda estão empilhados por lá e eu por aqui de enfermeiro, tento curar minhas dores até o próximo repique da campainha.
Nossos livros estão à venda na Nobel do centro e shopping de Piracicaba, mas se estiver esgotado lá, nos enviem mensagens no e-mail acima e o providenciaremos autografado. Os grandes autores e editoras têm proeminência nas estantes e aparecem mais, o nosso carece de ver de perto; por isso somos independentes até o fio de cabelo e fazemos trecho a pé mesmo. Garimpai-nos! Temos O Efeito Espacial, conto, alegoria de um homem rato e um romance, O Seminário, peripécias de um jovem seminarista em busca de sua espiritualidade dentro de uma ordem religiosa em confronto com o mundo e suas contradições. Aos que quiserem, mando novamente a sinopse e comentários das obras.